quinta-feira, 23 de agosto de 2012

ALGO DE NOVO EM CARAJAS


O que esta provocando este terremoto social em relações tão claramente demarcadas?

Há meses somos surpreendidos quase cotidianamente por massivas e silenciosas paradas e bloqueios na portaria da VALE em Parauapebas. Na principal porta de acesso a Mina de N4, varias empresas são surpreendidas por jovens e novas lideranças, sindicatos colocados à parte, não são mais confiáveis, assumindo o papel de interlocutores, renegando os acordos sindicais conchavados.
Estas paralisações, como já postado, atravancam a vida de Parauapebas. E acontecem de forma repentina, rápida e na forma de impasse: não deslocamos, queremos negociar e obter. Ficamos surpresos que, numa região onde inteligentes e capacitados advogados, lideres sindicais e chefes de RH desdenham nossa consultoria de conflitos, permitiram consolidar a percepção de que algo não vai bem na USINA ATRÁS DO MORRO, parafraseando J.J.Veiga.  Demonstram que não tem um plano de contingência para estas situações e, apesar da repetição, estamos vendo o mesmo filme há mais de quatro meses. Todos são surpreendidos. Nos temos uma visão e uma estratégia em como lidar com esta nova situação.


MUDANÇA DE CENARIO
Dentro do contexto do atual movimento salarial brasileiro, com grande parte do funcionalismo publico em greve e em face as violentas e transformadoras mudanças na economia, o grande capital sempre atrasado, não se preparou para atender possíveis reivindicações e cobranças por parte da massa assalariada. Estas negociações deveriam ter acontecido la atrás, quando se tinha uma perspectiva melhor da economia mundial. Agora vem um pouco tarde. Na verdade, vem  na esteira das grandes obras do PAC, do  esforço exportador de bens primários e claro, do canteiro de obras e seu espraiamento pelo economia como um todo alem das obras da copa do mundo e das olimpíadas. Se vamos dar conta, ninguém sabe. Se os fundamentos econômicos da nação são realmente sólidos, é agüentar os testes. Os recursos estão alocados, somos a quinta economia do mundo.

IDADE MEDIA
Evoluimos como economia, obtendo posições no ranking mundial mas estamos ainda na idade media como sociedade. Baseado num modelo altamente concentrador de renda e melhorias, com a pobreza sendo reduzida lastreada na distribuição aleatória do bolsa família e outros programas sociais, não temos uma sustentação lógica e a prova de testes de crescimento econômico. As premissas lógicas de crescimento sustentável passam ao largo da nossa evolução: a população continua analfabeta, temos menos universitários que a Bolívia, não há atendimento de saúde publica, o aparato repressor do estado tem a brutalidade do regime sírio, a discriminação racial é parte integrante da escalada econômica, as crianças estão em escolas de péssima qualidade, os preços são altos e exorbitantes. Não se entende de planejamento, de custos ou de poupança. E é neste contexto que devemos analisar os recentes acontecimentos na portaria da VALE e em toda Parauapebas.
  
REAÇÃO TARDIA
É um momento histórico para a região do Projeto Carajás. O pacto negociado não esta mais funcionando. Será necessário uma nova direção, novos atores e novo foco. Acreditamos que  a solução para este novo momento onde, quando parada a portaria da VALE todos saem perdendo, sejam negociações  de alto nível, incluídas as novas lideranças.  Foi em conversas com um desses novos lideres a respeito de um novo movimento sindical, sem peleguismo ou negociações espúrias que tivemos acesso a dimensão dos novos fatos: “....estávamos em reunião com a empresa, eu e meus companheiros, quando adentram um tal de Canindé, acompanhado de Rômulo, acreditamos que seja um advogado. Logo trataram de desqualificar nosso movimento e representatividade, alegando serem representantes do sindicato. Nunca ouvi falar deles. Depois descobri que eram representantes da categoria e haviam negociado a miséria que estávamos rejeitando”. Canindé é líder sindical há 20 anos, à frente do famigerado Sindiclepemp. Fica ai a vexatória explicação: todos os lideres sindicais fazem a política de apadrinhamento. Estão diretores há duas décadas, portanto acostumados a negociar com empresas e se acostumaram aos cargos.  Não são mais representantes da categoria, nem na área de trabalho vão, há anos. Algo de novo precisa acontecer, nem que seja esta reação tardia de agora. Um sindicalismo moderno, baseado na negociação, em nova legalidade e resultados.

MOVIMENTAÇÃO CONSTANTE
Diante de acordos salariais que constam plano de saúde apenas para o titular, cestas básicas no valor de 170 reais e outras loucuras locais, não tem como manter a calma e a mina funcionando.  Depois de decisão da justiça trabalhista de Parauapebas, ordenando a VALE a pagar 300 milhões referentes a danos morais e horas intinere, parte aos trabalhadores, parte a obras sociais, a situação esta se tornando sem controle, como vemos nos últimos meses.

Todos perceberam, pelo tamanho da multa, que algo esta muito errado com seus salários. Apesar de ter sido iniciativa dos sindicatos, temos razões para entender ser muito mais interesse pessoal dos advogados envolvidos no caso. Este fantoche de horas intinere tem acolhida apenas no Brasil, onde o sucesso é vitrine e motivo de inveja e disputas pelo seu bem ganho ou gerado por seu trabalho.

O problema aqui é que as empresas, a VALE a frente, vêem desdenhando qualquer conhecimento que não o seu próprio. Relevam seus próprios funcionários ao entender que seus testes de admissão ultrapassados e sua relação de poder e comando são incontestáveis. Não são. Há inteligência e vida alem dos contrafortes da mina de Carajás.  As empresas precisam se estruturar para enfrentar os novos tempos. Um novo momento de negociações transparentes, baseada na nova economia: aumento substancial da despesa com pessoal, profissionalização da gestão, política de resultados com base na produtividade e na competência na administração de pessoas. Uma fase adulta e mais profissional nas relações  e negociações com sua mao de obra, razão dos sucessivos recordes de produção e exportação que fazem de Parauapebas a cidade de maiores vendas ao mercado externo e uma das cidades lideres em exportações no hemisfério sul. Algo merece e tem que ficar por aqui. Que seja melhores salários e melhores condições de vida.

HAVERÁ ESTRATEGIA OU VIDA INTELIGENTE DENTRO DAS EMPREITEIRAS?
Vem a calhar a observação. Decididamente não há.  Percebemos o desdém e menosprezo de todos perante a relação de trabalho que há com os prestadores de serviços e empregados, a massiva maioria oriundos do pobre e desolado interior do Maranhão. Primeiro, a humilhação de ter carteira carimbada pela bolsa de trabalhado de Parauapebas e titulo de eleitor local. Segundo, se submeter ao comercio dos cargos e vagas. Por 200 reais pode-se comprar qualquer vaga na própria bolsa. A submissão em filas intermináveis e, quando se livram da famigerada bolsa de trabalho, horas e horas, desconfianças e maus tratos na porta das empreiteiras que não se submetem ao esquema. Há dois vereadores na Camara de Parauapebas que  levam vantagem com a situação: Massud e Odilon. Diretamente. Estranhamente diretamente também, a oligarquia do PT local. Digo estranhamente porque esta não era a vocação original do Partido dos Trabalhadores. Em seguida os exames médicos. Não pode dar errado, aparecer qualquer doença, qualquer mal nestes exames.  São sumariamente descartados, nunca são encaminhados a tratamento. 
O psicotécnico que a principio eliminou trabalhadores, hoje se resume a uma entrevista  clinica e tudo bem. Depois vem o treinamento nos requisitos de atividades criticas. Sistema de admissão do trabalhador às minas de Carajás e região. São onze atividades e previnem acidentes na mina. Louvável e importantíssima exigência, mesmo porque a mao de obra local é incipiente. Mas ocorre um problema serio aqui. A maioria destes trabalhadores são semi-analfabetos, sendo uma elite detentora do segundo grau real, feito de fato em sala de aula ou supletivos. São trabalhadores rurais e semi-oficiais que buscam melhores condições de vida aqui. É um martírio para a maioria, mas vão se ajeitando e fazendo o possível até chegarem a  etapa final do processo seletivo, dois dias de introdutório, agora liderados pela própria VALE. Neste momento se confere a capacidade de interpretação de fato destes seres seriamente empenhados em subirem à mina. Após dois dias precisam de  nota e aprovação. Quase ninguém é reprovado. Porque, se quase todos são semi-analfabetos? Porque tudo foi adaptado a esta necessidade. Não há programa publico ou privado para se mitigar a situação.



 Depois de tudo isto, fica o funcionário sujeito e esperar a ordem de serviço que pode demorar de uma semana a três meses. Todo este processo pode demorar de uma semana a três meses. Estamos para trabalhar na área da VALE, a então maior mineradora do mundo. Não temos informações do tempo em outros países e nem temos comparativos de gestão para discutir de certo ou errado. Mas as pessoas não merecem e não deve, em lugar algum desse mundo, serem tratadas assim. Disso sabemos.

PODE-SE FAZER DIFERENTE
Todas as empreiteiras passaram pelo que a Construtora Rio esta passando hoje. Ontem foram a Multiserv, a UTC, Plamont. Amanha serão a Mactron, Makro ou qualquer das empreiteiras. Há algo de errado no processo de contratação da VALE, em todo ele.  Há uma forte mudança na relação de trabalho e mesmo nas relações sociais na região.

Carecemos e precisamos de estudos apropriados para se analisar o fenômeno que ocorre nesta região remota do Brasil. Não se tem papel para carteira de trabalho, um alistamento militar provoca filas quilométricas, uma simples carteira de identidade leva em media 30 dias para ficar pronta, isto quando tem material e é costume não ter. Uma consulta médica pública pode demorar até 48 horas em fila e um marmitex pequeno custa em media 10 reais. Terra dos imóveis mais valorizados do mundo, o sul do Para sempre foi terra de ninguém. Talvez uma região de interesses  espúrios e conchavos inconfessáveis, tem neste contingente de jovens, utilizados tal qual material de consumo, um novo exercito de peões famintos, saudosos e errantes. E empresas cada vez mais ricas e admiradas por recordes sucessivos de produção, por novos contratos  cada vez com maiores somas e políticos cada dia mais ricos e inalcançáveis. Afinal, quem se interessa pelo sul do Pará?