Produção
de alimentos é suficiente, mas ainda há fome no país, diz pesquisador
- 16/07/2016 19h39
- São Paulo
Elaine
Patricia Cruz – Repórter da Agência Brasil
Estudo revela que o Brasil produz
mais que o suficiente para alimentar sua população, mas a desigualdade de renda
e o desperdício fazem com que 7,2 milhões ainda sejam afetadas pelo
problema Arquivo/Agência Brasil
A produção nacional de alimentos
é suficiente para os mais de 204 milhões de brasileiros, mas a desigualdade de
renda e o desperdício ainda fazem com que 7,2 milhões de pessoas sejam afetadas
pelo problema da fome no país, revela estudo conduzido pelo professor Danilo
Rolim Dias de Aguiar, pesquisador do Departamento de Economia do Campus
Sorocaba da Universidade Federal de São Carlos.
“Temos uma concentração de renda
muito grande. Se, por um lado, temos pessoas passando fome, por outro, temos o
problema da obesidade, que é cada vez maior. Haveria, então, um problema ligado
à renda e à educação, que estaria dificultando o acesso aos alimentos. Aí
também entra a questão das perdas”, disse Aguiar.
Na pesquisa, Aguiar fez um
levantamento sobre o que é produzido no país, pegando os principais alimentos –
arroz, feijão, trigo, ovos, leite, milho, soja, banana, açúcar, mandioca e
carnes de frango, de porco e bovina – e os transformou em um indicador comum que
permitisse uma comparação mais adequada entre eles, calculando todos os itens
em número de calorias ou proteínas.
Segundo o pesquisador, a
quantidade média necessária para consumo individual por dia, e que foi
considerada neste estudo, é de 2 mil calorias e 51 gramas de proteína.
“Peguei tudo aquilo que ficou no
Brasil para consumo humano e transformei isso em calorias e proteínas. O que
verificamos foi que, em termos de calorias e proteínas, temos mais que [o
suficiente para] as necessidades humanas aqui no Brasil. Se pegarmos calorias,
que é uma situação um pouco pior, chegamos, em 2013, com 118% das necessidades
individuais, uma folga de quase 20%. Em termos de proteína, teríamos uma folga
de mais de 60%, ou seja, estariam sobrando alimentos”, explicou Aguiar.
Desperdício de alimentos é um dos fatores que
contribui para agravar a questão da fome Arquivo/Agência Brasil
Em entrevista à Agência Brasil,
o pesquisador disse que muitas pessoas ainda passam fome no Brasil
principalmente pela dificuldade de acesso à alimentação. Apesar de o país
ocupar o quinto lugar no ranking mundial da obesidade, ainda há mais de
7 milhões de pessoas passando fome e 30 milhões de subnutridos.
No estudo, Aguiar analisa também
o volume de produtos exportados pelo Brasil. Para o professor, o volume de
alimentos exportados poderia, por exemplo, alimentar duas vezes toda a
população brasileira. Quando se transforma o total que é vendido para o
exterior em calorias, percebe-se que a quantidade seria suficiente para
alimentar quase 700 milhões de pessoas.
“Peguei todos os produtos que o Brasil exporta, como milho, soja, carne bovina e carne de frango, transformei em calorias e proteínas e dividi pelas necessidades de cada pessoa para saber quantas poderiam ser alimentadas no exterior com as exportações brasileiras. Em 2013, as proteínas que o país exportou dariam para nutrir 700 milhões de pessoas. Em termos de calorias, seriam 380 milhões de pessoas. Aquilo que estamos vendemos lá fora seria capaz de alimentar duas vezes a população brasileira em termos de calorias e três vezes em termo de proteínas”, detalhou Aguiar.
“Peguei todos os produtos que o Brasil exporta, como milho, soja, carne bovina e carne de frango, transformei em calorias e proteínas e dividi pelas necessidades de cada pessoa para saber quantas poderiam ser alimentadas no exterior com as exportações brasileiras. Em 2013, as proteínas que o país exportou dariam para nutrir 700 milhões de pessoas. Em termos de calorias, seriam 380 milhões de pessoas. Aquilo que estamos vendemos lá fora seria capaz de alimentar duas vezes a população brasileira em termos de calorias e três vezes em termo de proteínas”, detalhou Aguiar.
No entanto, isso não ocorre em
realidade porque muito do que é exportado pelo Brasil vira comida para animais,
disse o professor. “Isso não está alimentando tanta gente porque boa parte do
que se exporta – como milho e soja – não vai virar diretamente comida para
pessoas, mas comida para animais."
O pesquisador classifica de
"cruel" essa situação em que "as pessoas de baixa renda acabam
concorrendo com os animais, porque aquilo que poderia ser utilizado para
alimentação humana vai para a alimentação animal, pois as pessoas de maior
renda querem cada vez mais consumir carne. Como resultado disso, o preço dos
produtos básicos sobe, porque há pouco, e fica cada vez mais difícil o acesso
por parte dos pobres”.
Políticas públicas
Brasileiros estão produzindo muito mais carne do
que arroz e feijão porque a carne dá mais rentabilidade, diz
o professor Danilo Aguiar,
do Campus Sorocaba da Universidade Federal de São Carlos Arquivo/Agência Brasil
Para Aguiar, políticas públicas
são necessárias para diminuir o consumo de carne. Ele destacou que o
crescimento do consumo da carne é acompanhado pelo aumento da crise ambiental,
já que, por exemplo, a produção da carne bovina é responsável por 10% das
emissões de gases de efeito estufa na atmosfera e é o principal emissor do
agronegócio.
De acordo com o pesquisador,
outro problema relacionado ao aumento do consumo de carne no país é que muito
da produção de milho e soja, por exemplo, acaba sendo destinado à allimentação
dos animais.
“Por que os produtores brasileiros estão produzindo muito mais carne do que arroz e feijão? É porque isso, para eles, dá maior rentabilidade. Temos que ter políticas que incentivem a produção de alimentos que atinjam as classes de renda mais baixa e que sejam menos danosas ao meio ambiente.”
“Por que os produtores brasileiros estão produzindo muito mais carne do que arroz e feijão? É porque isso, para eles, dá maior rentabilidade. Temos que ter políticas que incentivem a produção de alimentos que atinjam as classes de renda mais baixa e que sejam menos danosas ao meio ambiente.”
Aguiar alertou, no entanto, que
essas políticas precisam ser articuladas mundialmente. "Temos que entrar
com políticas, mas articuladas em termos mundiais. Não dá para o Brasil tomar
uma decisão unilateral, de não querer produzir tanta carne, se o mundo inteiro
quer comprar carne. Tem que haver uma articulação maior para que se atinjam
esses objetivos. E uma coisa que vai ajudar muito é a educação. Cerca de 99%
das pessoas não têm noção se aquilo que elas estão comendo tem algum impacto
ambiental.”
Edição: Nádia
Franco
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